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Aquecimento global poderá causar epidemia de doenças renais. O governo do Brasil não faz sua parte.

Matéria publicada na revista "Exame" informa que as mudanças climática poderão expor a humanidade a uma epidemia de doenças renais, com consequências imprevisíveis. 

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Aquecimento pode causar epidemia de doença renal, dizem especialistas

Para Tord Kjellstrom, da Universidade da Austrália, estresse causado pelo calor não está recebendo a atenção necessária nos debates sobre o tema

doença renal crônica, associada ao estresse provocado pelo calor, pode se tornar uma grande epidemia de saúde para milhões de trabalhadores em todo o mundo, se as temperaturas globais continuarem a aumentar nas próximas décadas.

Especialistas ouvidos pelo The Guardian pedem mais estudos urgentes sobre a relação entre o calor e CHDu — doença renal crônica de causa incerta — para avaliar a situação.

A doença renal crônica (DRC) é a perda progressiva da função renal, amplamente observada entre idosos e pessoas que sofrem de outras doenças, como diabetes e hipertensão. No entanto, epidemias de DRC estão surgindo em regiões rurais com temperaturas elevadas, em países como El Salvador e a Nicarágua, onde um elevado número de trabalhadores rurais começou a morrer de insuficiência renal irreversível.

Têm surgido também casos de CKDu em pessoas que realizam trabalhos manuais pesados em zonas quentes de outras regiões, como o continente americano, Oriente Médio, África e Índia.

Os rins são os responsáveis pelo equilíbrio de fluídos no corpo, o que os torna particularmente sensíveis a temperaturas extremas. Há consenso emergente de que o CKDu deve ser reconhecido como uma lesão relacionada com o calor, em que os trabalhadores desenvolvem danos sutis nos rins todos os dias enquanto estão nos campos agrícolas. Isso, por sua vez, pode evoluir para doença renal grave ou insuficiência renal crônica ao longo do tempo.

O ataque aos rins nem sempre vem acompanhado por sintomas, o que pode fazer com que os trabalhadores acabem com uma doença renal crônica em estágio terminal.

Para Tord Kjellstrom, do Centro Nacional de Epidemiologia e Saúde da população da Universidade da Austrália, o estresse causado pelo calor não está recebendo a atenção necessária nos debates sobre como mitigar os primeiros efeitos da emergência climática.

À medida que aumenta o número e a intensidade dos dias quentes, cada vez mais pessoas que trabalham enfrentarão desafios ainda maiores para evitar o estresse causado pelo calor, particularmente dois terços da população global que vive em áreas tropicais e subtropicais. A exaustão pelo calor ameaça a subsistência de milhões de pessoas e prejudica os esforços para reduzir a pobreza”, diz.

Tord Kjellstrom alerta que o aquecimento global é uma séria ameaça à vida dos trabalhadores e ao sustento de milhões de pessoas. "As políticas emergentes sobre o clima devem levar isso em consideração se quisermos ter alguma possibilidade de enfrentar o que está para vir”.

Segundo a médica Cecilia Sorensen, diretora do Consórcio Global sobre o Clima e Educação em Saúde da Universidade de Columbia, “não temos ideia de qual é a extensão do problema porque não estamos observando”.

“Existem algumas regiões que são claramente pontos críticos, mas em termos de sua prevalência e da seriedade do problema, acho que ainda não começamos a envolver-nos nisso”, acrescentou. No entanto, as epidemias documentadas apresentam características semelhantes. Os afetados tendem a ser pessoas que trabalham em condições de calor e vêm de ambientes desproporcionalmente vulneráveis – social e economicamente – com acesso limitado a cuidados médicos ou seguro, ou que vivem em áreas com fracas infraestruturas de saúde.

Segundo Cecilia, “de acordo com os dados atuais, parece que a gravidade renal piora quanto mais vulnerável e desesperado o trabalhador fica. Os que não têm controle sobre as suas condições de trabalho ou são incentivados a trabalhar mais horas sem pausas, como os que recebem pelo número de frutas que colhem ou pela quantidade de cana que cortam, são os mais afetados”.

“Estão ficando doentes pelo trabalho que fazem e não têm outras opções. Há pouca supervisão no ambiente de trabalho que impeça que isso aconteça. É uma questão de direitos humanos”, afirma.

Ramón García Trabanino, nefrologista e diretor médico do Centro de Hemodiálise de El Salvador, afirmou que notou, pela primeira vez, um número incomum de pacientes com DRC no hospital onde trabalha há mais de duas décadas.

“Eles eram jovens e estavam morrendo porque não tínhamos dinheiro ou capacidade para fazerem tratamentos de diálise. Fizemos o melhor que podíamos, mas eles continuavam a morrer. E cada vez chegavam mais com os mesmos sintomas”, acrescentou.

Trabanino analisar epidemias semelhantes no México, na Nicarágua, Costa Rica e no Panamá.

“Se olharmos para as temperaturas máximas na América Central, vimos que correspondem às regiões onde estamos descrevendo a doença. Em El Salvador e na Nicarágua, as taxas de mortalidade são cerca de dez vezes mais altas do que era de esperar. O número de novos pacientes é impressionante”.

Apesar da visão consensual de que o CKDu esteja relacionado ao calor e à desidratação, alguns cientistas acreditam que a exposição a agroquímicos e agentes infecciosos, bem como a composição genética e fatores de risco relacionados à pobreza, desnutrição e outros determinantes sociais da saúde, também podem desempenhar um papel.

“O que está menos claro é o fato de que o estresse recorrente por calor não é apenas um problema nos campos de cana-de-açúcar na Nicarágua. Mesmo nas nossas sociedades, a possibilidade de estresse causado pelo calor e a desidratação podem ter um papel na doença renal”, afirma Richard Johnson, professor de medicina da Universidade do Colorado.

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