SINDICATO EXPRESSO 2015-002
23 de Fevereiro de 2015
Sindicato dos Médicos de Juiz de Fora e da Zona da Mata
CARREIRA DE ESTADO DOS MÉDICOS AINDA ESTÁ NA AGENDA
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O jornal “Medicina”, do CFM (Conselho Federal de Medicina), de janeiro de 2015, trouxe uma matéria com o título “Carreira de Estado para Médico – Tramitam no Congresso três propostas”, publicada na sua página 8.
Na matéria constata-se que a maioria dos médicos brasileiros é a favor da criação da carreira de estado, 96%, em pesquisa realizada pelo Instituto Vox Populi, em fevereiro de 2014. O CFM sabe muito bem que o governo brasileiro tem sido incompetente para atrair e fixar médicos no serviço público, recorrendo a expedientes improvisados, como terceirizações, bolsas, consórcios, etc. Esses recursos caracterizam a precariedade dos contratos de trabalho, no processo chamado de “precarização”. Contratam-se médicos sem concurso público, sem plano de carreira, de forma atabalhoada, alegando sempre uma emergência que nunca é equacionada e sempre serve de argumento para a improvisação seguinte. O resultado é a reprodução da precarização . Faltam, em todos esses casos, o componente essencial de todas as soluções que partem do estado: a vontade política.
A matéria citada se refere a três PECs (Proposta de Emenda Constitucional).
A primeira, pronta para ser incluída na pauta de votação do plenário da Câmara dos Deputados é a PEC 454, de autoria do então deputado e atual senador Ronaldo Caiado, médico ortopedista de Goiás, que faz parte da bancada do DEM. A segunda é a PEC34/2011, de autoria do então senador paraibano do PMDB, Vital do Rego. A terceira, de autoria do mesmo Vital do Rego, é a PEC 46/2013.
A PEC 454 cria uma carreira única de médicos, mantida pela União, mas que os profissionais poderão ser cedidos para atuar nas esferas estaduais e municipais. A remuneração seria fixada de acordo com um piso nacional definido em lei específica (como já acontece no caso dos professores) e a carreira valorizará tempo de serviço e os níveis de qualificação na área médica. A possibilidade de cessão dos integrantes dessa carreira para estados e municípios é algo que já existe no SUS, tendo sido praticada mais ativamente quando da implantação do SUS, com a “municipalização” de servidores públicos estaduais e do antigo INAMPS.
A PEC 34/2011 determinada a dedicação exclusiva do profissional médico da carreira de estado ao SUS, sem concessões, que o médico seja obrigado a residir no município ou na região metropolitana onde esteja lotado e participe de “cursos de preparação e aperfeiçoamento”, sendo essa participação obrigatória para o processo de promoção.
O mesmo autor da PEC anterior, apresentou também a PEC 46/2013, que altera o artigo 241 da Constituição Federal (1), instituindo o “consórcio público de direito privado” (sic) para atuação na atenção básica do SUS. Nesse caso os médicos que exercem atividade fim no serviço público de saúde, na atenção básica, seriam dispensados de prestar concurso público, nem servidores públicos seriam, mas empregados contratados pela CLT pelos tais consórcios. Atuariam em qualquer “órgão ou entidade” de “quaisquer entes federados consorciados”.
O presidente do CFM, Conselho Federal de Medicina, Dr. Carlos Vital, admite, nessa mesma matéria, que a precarização do trabalho médico é uma infeliz realidade. Mas declara que tanto a PEC 454 quanto a 46 tem aprovação dos profissionais. Ele defende, na mesma fala a PEC 454, falando de sua segurança jurídica e de suas vantagens em termos de contratação da mão de obra.
A PEC 46/2013, nada mais é do que café requentado. Requenta a ideia proposta por Temporão, ministro da saúde do Lula, indicado pelo Sérgio Cabral, do estranho negócio das fundações públicas de direito privado, destinadas a intermediar mão de obra nos serviços públicos de saúde. Seria uma espécia de “gato” legalizado. (O termo “gato”, para quem desconhece, é usado para se referir aos elementos que arregimentam bóias-frias para o trabalho agrícola, intermediando mão de obra). O projeto das “fundações privadas de direito público” ainda tramita no Congresso, apesar das derrotas que sofreu (http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/SAUDE/448361-PROJETO-DAS-FUNDACOES-DE-DIREITO-PRIVADO-PARA-A-SAUDE-PODE-GERAR-POLEMICA-NO-PLENARIO.html)
A PEC 46 também transforma os médicos é uma categoria de servidores públicos de terceira classe. Não prevê o concurso público. Portanto, médico seria dispensado definitivamente de prestar concurso público, para ser empregado de empreiteiras da saúde. Se aprovada essa PEC, os médicos seriam os únicos cidadãos brasileiros penalizados por sua formação profissional. Não se aplicaria a eles o que dispõe a Constituição:
Artigo 37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
I - os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
O Senador Vital do Rego não exerce mais seu mandato. Atualmente é ministro do Tribunal de Contas da União.
Político paraibano, conhecido em sua terra natal como Vitalzinho, é filho e irmão de políticos, formou-se em Medicina e Direito, mas dedicou-se preferencialmente à política. Sua indicação ao Tribunal de Contas da União deveu-se à ação do senador Renan Calheiros, descartando a petista Ideli Salvatti, que teria dificuldades em vencer qualquer eleição que envolvesse votos no plenário do Senado ou da Câmara.
Sobre a indicação e aprovação de Vital do Rêgo para o TCU (tribunal de contas da união), em novembro-dezembro de 2014 a imprensa deu destaque na época. Citamos a coluna "Radar" do Lauro Jardim:
1) http://veja.abril.com.br/blog/radar-on-line/congresso/vital-do-rego-no-tcu/ recuperado em 25 de novembro de 2014 "Renan Calheiros acertou ontem com Dilma Rousseff a indicação do senador Vital do Rêgo para uma cadeira no TCU. Vital, pelos serviços prestados ao governo na CPMI da Petrobras, virou um nome sem páreo para o posto."
2) http://veja.abril.com.br/blog/radar-on-line/tag/vital-do-rego/ 25 de novembro de 2014 "A candidatura de Ideli Salvatti ao TCU subiu no telhado. Termina hoje o prazo para a inscrição de candidatos, e apenas o PMDB enviará o nome de Vital do Rêgo. Se entrasse na disputa, sem o apoio do aliado, Ideli perderia.
Apesar do acerto de Dilma Rousseff com Renan Calheiros, o PT não gostou. O acordo fechado há meses previa que a vaga de José Jorge fosse de uma indicação dos senadores do partido, e não novamente do PMDB."
Renan, é bom que se lembre, teve papel muito importante na manutenção do veto de Dilma contra a regulamentação da Medicina no Brasil (o "ato médico") - http://www.cremesp.org.br/?siteAcao=Imprensa&acao=crm_midia&id=694
E também no veto à carreira de estado para médicos, anteriormente aprovada pelo Congresso, após negociações entre o então presidente do CFM, Roberto D'Ávila, e a bancada do PT. O negócio terminou em molecagem: Dilma vetou a carreira de estado (sob um pretexto enviesado) e o Congresso manteve o veto da Dilma, também com a ajuda de Renan. Os médicos brasileiros não podem esperar bondades de Renan.
É bom lembrar que a maioria dos médicos brasileiros perdeu a ingenuidade política com os enfrentamentos com o governo da atual presidente. Não esperam gestos de boa vontade do governo. Mas, também não são tolos a ponto de comprar gato por lebre. Carreira de estado de médico não existe sem concurso público para médico. Não podem as entidades médicas tergiversar nessa questão essencial para a classe médica.
(1) Art. 241. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios disciplinarão por meio de lei os consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
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