24/09/2011
Em artigo publicado pela Folha de S. Paulo neste sábado, presidente da
CUT defende cobrança sobre fortunas e heranças para financiar a saúde
pública
Escrito por: Artur Henrique, presidente da CUT
A discussão em torno da emenda constitucional 29 e da necessidade de
ampliar as verbas para a saúde pública traz mais uma boa oportunidade
de reapresentarmos a proposta de uma reforma tributária digna do nome,
que torne progressiva a estrutura dos impostos no país.
Para tal desafio, precisaremos implementar alguns instrumentos, dentre
os quais vale destacar aqui a criação de um imposto sobre grandes
fortunas, heranças e propriedades.
Existem no Brasil, segundo dados de consultorias privadas, 155 mil
pessoas com pelo menos R$ 1 milhão prontos para serem investidos no
mercado financeiro. Elas compõem a face mais visível de uma riqueza
que provavelmente é muito maior do que essa e, portanto, ainda mais
concentrada do que os números fazem parecer.
Muito desse dinheiro não paga imposto, ao contrário do salário.
Distribuição de lucros e dividendos, por exemplo, são dedutíveis de
tributação no Brasil desde 1995. Enquanto isso, o trabalhador que
conquista participação nos lucros e resultados da companhia paga IR
sobre essa parcela. Está evidente a diferença de critério.
A remessa de dinheiro para o exterior sem tributação -essa faceta
misteriosa, mas da qual ninguém duvida, de nossa injustiça fiscal-
impede a sociedade brasileira de dimensionar quantos recursos
produzidos aqui poderiam melhorar a oferta de serviços públicos e
políticas sociais.
Esqueçamos por ora que parte desse cenário deveria compor a crônica
policial, se não fosse a existência da lei 9.249/1995, que extingue a
punibilidade de crime contra a ordem tributária. É preciso deixar
claro que não se trata aqui de perseguir ricos, mas sim de cobrar que
façam parte do jogo.
Se os ricos, como se convencionou dizer, de fato não deveriam sentir
vergonha de sua condição, então que se apresentem sem os benefícios
fiscais de que dispõem, em nome de um país socialmente justo.
É preciso também diferenciar os impostos sobre as atividades
produtivas de suas empresas -sim, eles existem- de suas fortunas
pessoais. Os primeiros, além de serem distribuídos por toda a
sociedade na forma de preços, não são moral e civicamente o sacrifício
máximo a perdoar a ausência dos demais.
A saúde pública brasileira precisará, segundo o governo, de R$ 30
bilhões adicionais por ano para viabilizar a EC 29. Uma das fórmulas
mais modestas de imposto sobre grandes fortunas, entre tantas já
propostas, daria conta do recado: 1,5% de alíquota média anual sobre
patrimônios que ultrapassassem 8.000 salários mínimos. Assim, já
teríamos o dinheiro necessário.
A recente recusa da Câmara em aprovar a criação da Contribuição Social
para a Saúde (CSS) mostra que a tarefa não é simples. A CSS iria
incidir apenas sobre cidadãos que ganham mais do que o equivalente ao
teto da Previdência Social (R$ 3.691). Isso representa aproximadamente
5% dos que trabalham.
Embora parte desse público não deva ser considerado rico, a proposta
da CSS, de autoria do deputado Pepe Vargas (PT-RS), aponta para o
conceito de progressividade tributária. Esse detalhe, nada
desprezível, foi ocultado pela imprensa.
Sabe-se que, recentemente, um grupo de milionários franceses e o
bilionário investidor norte-americano Warren Buffett vieram a público
pedir que seus governos aumentem a taxação sobre eles.
Bondade, espírito cívico? Talvez. Mas a iniciativa sem dúvida mostra
que eles sabem ser mais vantajoso ter uma parcela um pouco menor numa
sociedade de economia mais dinâmica e com melhores condições de vida.
Publicado originalmente na Folha de S. Paulo do dia 24/09/2011
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